Em um estudo inovador publicado hoje na Nature Astronomy, pesquisadores aproveitaram as propriedades únicas do denso aglomerado estelar Terzan 5 para lançar nova luz sobre o comportamento dos raios cósmicos e os campos magnéticos que influenciam suas trajetórias. Este laboratório celestial, situado em uma parte da Via Láctea atualmente movendo-se rapidamente pelo espaço, ofereceu uma oportunidade sem precedentes para medir como os raios cósmicos mudam suas trajetórias devido às flutuações nos campos magnéticos interestelares.
Origem dos Raios Cósmicos
Os raios cósmicos, partículas altamente energéticas que viajam pelo espaço a quase a velocidade da luz, fascinam cientistas desde que foram descobertos pelo físico austro-americano Victor Hess em 1912. As observações de Hess mostraram que os níveis de radiação aumentavam com a altitude, mesmo durante eclipses solares, sugerindo que esses raios vinham do espaço, não da Terra. Essa descoberta marcou um novo capítulo na compreensão das fontes de radiação, distinguindo os raios cósmicos da radiação radioativa encontrada na Terra.
Embora os raios cósmicos tenham sido descobertos há mais de um século, suas origens exatas e comportamento ainda são parcialmente misteriosos. Essas partículas, que incluem núcleos atômicos e partículas subatômicas como prótons e elétrons, são desviadas por campos magnéticos. Esse fenômeno torna difícil rastrear suas origens, pois suas trajetórias tornam-se irregulares ao encontrarem esses campos, semelhante à forma como antigos tubos de raios catódicos (CRT) utilizavam campos magnéticos para direcionar elétrons.
Terzan 5
Terzan 5, um aglomerado globular de estrelas próximo ao centro galáctico, desempenhou um papel crucial no avanço do nosso conhecimento sobre os raios cósmicos. Este aglomerado contém um grande número de pulsares de milissegundos – estrelas de nêutrons altamente magnetizadas e de rápida rotação – que aceleram os raios cósmicos a velocidades extremas. Embora esses raios cósmicos não cheguem diretamente à Terra devido a desvios magnéticos, sua presença pode ser detectada através de raios gama gerados quando os raios cósmicos colidem com fótons da luz estelar. Ao contrário dos raios cósmicos, os raios gama não são afetados por campos magnéticos e viajam em linha reta para a Terra.
Um aspecto fascinante de Terzan 5 é o deslocamento observado nos raios gama em relação às posições esperadas das estrelas no aglomerado. Esse deslocamento, descoberto em 2011, intrigou os astrônomos até que uma nova explicação foi proposta. Terzan 5 está atualmente em uma órbita rápida e ampla que periodicamente o leva para fora do plano galáctico. À medida que o aglomerado se move pela Via Láctea a várias centenas de quilômetros por segundo, ele gera uma “cauda” magnética, semelhante à cauda de um cometa no vento solar.
A Jornada de Terzan 5 para a Terra
Os raios cósmicos emitidos por Terzan 5 viajam inicialmente ao longo dessa cauda magnética. Como a cauda não está apontada diretamente para a Terra, os raios gama gerados por esses raios cósmicos são projetados fora de nossa linha de visão. No entanto, devido às flutuações magnéticas, as trajetórias desses raios cósmicos eventualmente mudam, com alguns começando a apontar para a Terra. Este processo leva cerca de 30 anos, fazendo com que os raios gama pareçam deslocados em relação ao próprio aglomerado, pois eles vêm de uma região a aproximadamente 30 anos-luz de distância.
Esta descoberta permitiu aos cientistas, pela primeira vez, medir o tempo necessário para que flutuações magnéticas alterem a direção dos raios cósmicos. Esta medição é crucial para verificar teorias sobre campos magnéticos interestelares e suas flutuações, aproximando os pesquisadores da compreensão da radiação cósmica descoberta por Victor Hess há mais de um século. Através da lente de Terzan 5, os astrofísicos obtiveram informações valiosas sobre as interações dinâmicas entre os raios cósmicos e os campos magnéticos em nossa galáxia, representando um avanço significativo na astrofísica.